Crônicas de Quinta (e algumas poesias)
Sei que não faz
jus ao nome, trazer hoje essa inauguração, visto que não é quinta.
No entanto, me
parece um dia propício para revelar a nova trilha por onde também seguirá esse blog (talvez outra raiz, ou galho alto que almeja o céu, sendo que
erguer-se, ou se afundar, é o ato contínuo que por si só, é suficiente).
Aqui, no Crônicas
de Quinta, temos um espaço para dividir pensamentos, poemas e sonhos, feito aqueles ventos repentinos que balançam as vestes, as plantas e nossas bases.
Sem mais, um texto-poema de quando eu publicava no projeto do Rober Pinheiro, o Quotidianos.
Vicissitude
Quando o café, posto na xícara,
aguardava para ser saboreado deixando seu perfume no ar, Manoela ainda não
tinha certeza.
Quando a janela do quinto andar
deixou entrar o ar e vestígios da poluição, assim como os primeiros raios de
sol, ela ainda não havia resolvido.
A cama parcialmente desarrumada
pelo amontoado de vestidos de tons solenes, profundos, enviesados na melancolia,
era o sinônimo de sua busca dolorida.
O espelho refletia a parede
vazia, onde antes repousavam os prêmios de melhor funcionária, lembranças de
pessoas que foram amadas, a meta da dieta, a tabela de menstruação, os gastos
do último mês.
A louça não foi lavada, o chão
não foi varrido. Nem mesmo o wi-fi foi conectado naquele dia.
Manoela não apareceu no trabalho,
não ligou e nem poderia atender nenhuma ligação. Naquele dia, celular,
documentos e dinheiro ficaram sobre a mesa, junto com a nota-fiscal com o valor
e a data (já fazia mais de um mês) da compra de uma corda.
Manoela ensaiava aquela decisão.
Quando o café acabou e a xícara quase
vazia repousou na mesa - escorrendo da borda ao centro profundo e pálido a
última gota -, ela soube que não podia mais adiar.
Ela abandonou-se.
Dizem que Manoela desistiu, que
foi fraca, que deveria ter insistido mais. Outros acreditam que tivesse um
problema psicológico grave.
A única certeza, é que depois
daquela manhã, ela havia deixado de ser o que se sabia, para ser quem desejava
ser, quando ainda era menina.
Manoela voltara a pular corda, e
a cada volta, voltava a entender, como recomeçar e o que deveria deixar de ser
presente, e ficar no passado.
Simplesmente fantástico! Parece-me uma veia poética nata, o surpreender os espectadores com a reviravolta. Também ocorreu-me que sempre pensamos no pior. A desgraça talvez esteja tão próxima que um lampejo de luz confunde-se com trevas, se assim for possível. Parabéns! A cada dia torno-me fã com mais intensidade!!!
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